O Regime de Previdência Complementar operado pelas entidades fechadas (EFPC’s) enfrentou muitos desafios no ano de 2017 e, em 2018, não será diferente. No âmbito normativo/regulatório, apesar de alguns avanços, muito ainda precisa ser feito para o aprimoramento e expansão desse Regime.
O patrimônio de todo o sistema de fundos de pensão fechou o ano de 2017, conforme dados oficiais, em R$ 830 bilhões, o que equivale a cerca de 13% do PIB (Produto Interno Bruto), praticamente o mesmo percentual verificado nas duas últimas décadas.
Nesse contexto, ganha relevância o papel desempenhado pelo Conselho Nacional da Previdência Complementar – CNPC e pela Superintendência Nacional da Previdência Complementar – PREVIC. O primeiro exerce a função de órgão regulador do Regime de Previdência Complementar, por expressa delegação do Poder Legislativo, conforme disposto no art. 5º da Lei Complementar 109/2001. Já a PREVIC consiste no órgão de fiscalização e supervisão dos fundos de pensão, nos termos da Lei 12.154/2009.
Embora o CNPC tenha se reunido várias vezes no ano de 2017, a última Resolução emitida pelo órgão que foi publicada no Diário Oficial da União é a de nº 24, de 24.11.2016, publicada apenas em 21.02.2017 e que veio dispor a respeito da identificação e tratamento de submassas existentes nos planos de benefícios administrados pelas EFPC’s.
Em 13.09.2017, o CNPC aprovou duas Resoluções: uma regulamentando o fenômeno da transferência de gerenciamento de planos entre EFPC’s; e outra reconhecendo a legalidade de “transações remotas” no âmbito das Entidades, visando facilitar a manifestação de vontade dos participantes e assistidos e a redução de custos. Neste último caso, os participantes poderão realizar, exclusivamente por meio eletrônico, a adesão ao plano de benefícios, alterar percentuais contributivos e optar por institutos previdenciários, dentre outras situações que demandem a opção do participante.
Em 06.12.2017, por sua vez, o referido órgão regulador aprovou outras duas Resoluções, sendo a primeira para determinar a criação de comitês de auditoria no âmbito das EFPC’s, estabelecer regras para a prestação dos serviços de auditoria independente e prever a designação, pela Entidade, de um dos Diretores para ser o responsável por sua contabilidade, respondendo perante a PREVIC sobre o acompanhamento, supervisão e cumprimento das normas contábeis. O aludido comitê de auditoria funcionará como órgão auxiliar do Conselho Deliberativo. Durante a reunião do Colegiado, alguns Conselheiros questionaram, no entanto, certas competências imputadas ao comitê de auditoria, tendo em vista seu eventual conflito com as atribuições do Conselho Fiscal.
Na mesma data, o CNPC aprovou alteração nas regras de constituição e utilização dos recursos do PGA (Plano de Gestão administrativa) da EFPC, permitindo-se, notadamente, a realização de gastos com prospecção, implantação e fomento de novos planos de benefícios com novos recursos que venham a constituir o PGA.
Ocorre que, até 31.01.2018, nenhuma das quatro normas acima mencionadas havia sido publicada no Diário Oficial da União. A Secretaria do CNPC justifica a demora em face da necessidade de avaliação jurídica das Resoluções pela PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional), responsável pelo assunto no âmbito do Ministério da Fazenda. Assim, com a inserção da PREVIC e do CNPC no organograma do Ministério da Fazenda, é forçoso reconhecer que a PGFN passou a ser, sob o ponto de vista jurídico, um órgão de interlocução indispensável para a tramitação dos debates sobre normas e resoluções.
No que concerne à PREVIC, vale ressaltar que, em 2017, foram editadas várias Instruções sobre temas diversos, merecendo registro as seguintes:
a) Instrução 05, de 29.05.2017, que estabeleceu critérios para enquadramento de algumas EFPC’s como Entidades Sistemicamente Importantes (ESI), para fins de supervisão prudencial e proporcionalidade regulatória, considerando seu porte e sua relevância para o sistema (a relação das ESI foi divulgada por meio da Portaria PREVIC 580, de 29.05.2017).
b) Instrução 06, de 29.05.2017, que atualizou os procedimentos para certificação e habilitação de membros da diretoria-executiva, dos conselhos deliberativo e fiscal e dos demais profissionais de EFPC’s. Tal Instrução tem causado polêmica em face da previsão do requisito de reputação ilibada para o deferimento da habilitação pela PREVIC, uma vez que tal requisito não constaria na Lei Complementar 109/2001, nem na Resolução CNPC 19/2015. Neste ponto, de acordo com a Portaria PREVIC 1.146, de 11.12.2017, basta a condenação administrativa em primeiro grau (Diretoria Colegiada da PREVIC) para a aferição de perda da reputação ilibada.
c) Instrução 10, de 27.09.2017, que consolidou procedimentos e prazos para o cumprimento de algumas obrigações atuariais, contábeis e de investimentos das EFPC’s, dando mais racionalidade ao processo de apresentação de informações.
d) Instrução 15, de 08.12.2017, que conferiu à própria PREVIC a competência para adotar algumas medidas prudenciais preventivas em situações específicas. A referida Instrução está suscitando debates jurídicos quanto a sua forma e conteúdo, tendo em vista que, mediante avaliação discricionária do órgão fiscalizador, será possível, por exemplo, a suspensão cautelar da habilitação de dirigentes, o bloqueio prévio de investimentos específicos, a determinação de alteração estatutária, de regulamento ou convênio de adesão, ou mesmo de transferência de gerenciamento do plano para outra EFPC. Ao conferir um poder maior de intervenção ao órgão fiscalizador, essa Instrução impõe à PREVIC responsabilidade direta pelas consequências advindas de sua ação ou omissão.
e) Instrução PREVIC 16, de 11.12.2017, que, ao alterar a Instrução PREVIC 32/2016, trouxe uma restrição para os planos de equacionamento de déficits, qual seja, a exclusão da regra que permitia a utilização do excedente de rentabilidade financeira como fonte de recursos alternativa para o equacionamento do déficit.
Para 2018, conforme anunciado ao final do ano passado, o CNPC deve enfrentar temas complexos, destacando-se, dentre outros: a instituição de CNPJ por plano de benefícios, proposta esta que foi formalmente apresentada pela ABRAPP na reunião de dezembro; a revisão da Resolução CGPC 13/2014, para aprimorar as regras de governança dos fundos de pensão; bem como a consolidação, com alguns poucos aprimoramentos, das normas contábeis (Resoluções CNPC 08/2011 e CGPC 04/2002 e 15/2005) e das normas de atuária e solvência (Resoluções CGPC 18/2006 e 26/2008).
Foi noticiado pela PREVIC que o Poder Executivo também dará atenção à revisão do Decreto 4.942, de 2003, que regulamenta o processo sancionador e a aplicação de penalidades administrativas aos dirigentes de fundos de pensão que descumprirem a legislação em vigor. Em nome da segurança jurídica, o Decreto reclama ajustes pontuais, não a sua substituição integral.
Ainda conforme noticiado pela PREVIC, neste ano de 2018 devem ocorrer aprimoramentos das regras de investimentos previstas na Resolução 3.792/2009, do Conselho Monetário Nacional. Quanto a esse ponto, o CMN editou duas recentes Resoluções (nº 4.611, de 30.11.2017; e nº 4.626, de 25.01.2018), com o objetivo de aperfeiçoar as regras para as EFPC’s realizarem aplicações no exterior. Outros aspectos relativos à gestão de investimentos certamente demandarão novos ajustes, haja vista o cenário de redução da taxa de juros básica da economia.
Portanto, o que se espera para 2018 é a disposição da PREVIC de continuar o aprimoramento de sua capacidade de supervisão, em harmonia com o órgão normativo do setor, o CNPC, na defesa dos interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios das entidades fechadas de previdência complementar, bem como visando o fomento do Regime de Previdência Complementar.
Autor: Helder Florêncio